Poesia: A Santa de Sabará – Vinicius de Moraes

Vinicius de Moraes

À gravadora chilena Graciela Fuenzalida
que trocou o mundo por Sabará

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A um grito da Ponte Velha
Existe a “Pensão das Gordas”
(Cantou-as Mário de Andrade!)
Em Sabará. Na alpendrada
Sobre o rio que escorrega
A pensão mira a cidade
Ladeira acima.

Na Páscoa As quaresmeiras da serra
São manchas roxas de mágoa
E de manhã bem cedinho
A névoa pousa na terra
Como uma anágua de linho.

A cidade se espreguiça
Nas cores do casario
Que vive a pular carniça
Nas rampas de beira-rio.

E é doce vê-la sorrindo
Aos anjos do Aleijadinho
Que na portada do Carmo
Com bochechas inchadas
Assopram, de tanto frio.

Há paz na velha cidade
Uma paz de fazer longe…

A não ser na identidade
De certa dona chilena
Uma de rosto de monja
Corpo seco, tez serena
E que, na “Pensão das Gordas”
Onde há seis anos assiste
Desde o momento em que acorda
Vive, e nem sabe que existe
Entalhando na madeira
As horas mais dolorosas
Da Paixão de Jesus Cristo.

Atende por Graciela
Mas não atende a ninguém
Que não tenha como ela
A grande paixão do bem.

Sempre fechada em seu quarto
Mesmo a feição de uma freira
As suas dores do parto
Doem na carne de madeira
Onde ela entalha o fervor
De tudo o que há de mais casto
O rebanho e o bom pastor
O burrinho no seu pasto.
E às vezes, na nostalgia
Quem sabe, do mundo fora
Grava com luzes de aurora
Com milagres da poesia.

O viajante que passa
Itinerante por lá
Não se espante se, na aurora
Ou a luz crepuscular
Vir o vulto iluminado
De um belo arcanjo pousado
Guardando a casa onde mora
A santa de Sabará.

www.viniciusdemoraes.com.br

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